A agulha, o camelo e as mentiras dos homens
- Victor Hugo Ramallo
- 4 de set. de 2020
- 7 min de leitura

Neste texto a questão que tratarei será em torno de uma decisão que tomamos (às vezes de modo até inconsciente) e que define tudo sobre nossa relação para com o texto bíblico. A questão é simples: Consideramos a Bíblia como sendo a Palavra de DEUS ou como contendo a Palavra de DEUS?
A resposta imediata para o cristão é que a Bíblia é a Palavra de DEUS, mas infelizmente as ações cotidianas com relação a Palavra de DEUS são as que realmente determinam como a tratamos.
Como assim?
Em outro texto já mostrei que algumas traduções modernas alteram, distorcem e até suprimem trechos da Bíblia, trechos estes que encontramos nas chamadas traduções conservadoras, também pudemos observar como tais “diferenças” afetam de modo sério a compreensão do texto bíblico e o seu ensino.
Na verdade, a questão da “escolha” pela tradução e a percepção dos erros nas traduções modernas nos coloca ante a doutrina da Preservação das Escrituras Sagradas. O que é isso? Essa doutrina define:
Sendo o SENHOR o autor dos livros que compõe a Bíblia e tendo a firme convicção que ela é plenamente a Palavra de DEUS, deve ficar claro e patente que Ele mesmo preserva a fidelidade do texto bíblico através dos séculos. Tal ação é executada para que o ser humano, ao buscar estudar a Bíblia, possa estar seguro que em mãos tem o que o SENHOR quis que fosse preservado como Sua Palavra e esta é pura e sem a contaminação do pensamento ou vontade humana.
Na própria Palavra lemos que:
Porque em verdade vos digo que, até que o céu e a terra passem, nem um jota ou um til jamais passará da lei, sem que tudo seja cumprido. (Mateus 5.18)
Seca-se a erva, e cai a flor, porém a palavra de nosso Deus subsiste eternamente. (Isaias 40.8)
E muitos outros versos que deixam claro que a Palavra do SENHOR é eterna e Ele a preserva. Se negamos ou colocamos em dúvida esta doutrina alguns problemas surgem de imediato:
Se Ele não a preservou, como podemos ter certeza que aquilo que temos em nossas mãos e chamamos de Bíblia é a pura Palavra de DEUS? Quantos erros existirão nesse livro se o SENHOR não a tiver preservado?
Se Ele não a pode preservar, então devemos considerar Ele como DEUS? Na verdade, existiria algo como DEUS?
Mas, se aceitamos que esses dois problemas são reais, então toda a nossa fé seria uma farsa. É isso uma possibilidade?
Não. Não é. Temos diversos documentos históricos que provam a autenticidade das Traduções Conservadoras (Almeida Corrigida Fiel, Almeida Corrigida, King James Fiel e Bíblia Literal) e, desse modo, fica evidente que as Traduções Modernas (NVI, NLH, A Mensagem, Nova Versão Transformadora e outras) estão com falhas em seus textos, mas isso é tema para outro módulo mais avançado. Devemos estar cientes que os líderes das igrejas cristãs dos primeiros séculos (chamados de “pais da Igreja”) em suas cartas e escritos citam e confirmam as Traduções Conservadoras.
Bom, se de fato cremos que a Bíblia é a Palavra de DEUS e ela é a verdade e não apenas a contém, então estamos declarando que acreditamos no que nela está narrado e sabemos que é a expressão exata do que o SENHOR quer nos ensinar, mesmo quando são usadas as figuras de linguagem. Por exemplo a expressão do Senhor JESUS quando Ele fala “eu sou o caminho” (João 14.26) não significa que Ele se torna uma estrada, mas que metaforicamente está se mostrando como o meio de acesso ao Pai.
Isso significa aceitar que os milagres são reais e que são uma intervenção direta e objetiva do SENHOR na história e na natureza. Aceitamos e entendemos que de uma forma que Ele, e somente Ele, sabe fazer o que chamamos de “leis naturais” são de algum modo contornadas e Ele conduz como o deseja o curso da natureza. O pensador cristão C.S. Lewis chama isso de “conhecer a magia profunda” (vide o livro “O Leão, a feiticeira e o guarda roupa” da série Crônicas de Nárnia)
Tendo isto em mente, vamos analisar um texto que tem gerado muita confusão e discussão nos últimos anos. Vamos a ele:
E os discípulos se admiraram destas suas palavras; mas JESUS, tornando a falar, disse-lhes: Filhos, quão difícil é, para os que confiam nas riquezas, entrar no reino de DEUS! É mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha, do que entrar um rico no reino de Deus. (Mateus 10.24 e 25)
O que era a princípio um texto de fácil compreensão tem sido apresentado de formas que tem gerado confusão na compreensão de muitos crentes.
Afinal o Senhor JESUS está falando sobre como aquele que ama as coisas materiais tem dificuldades em depender exclusivamente da Vontade, Graça e Misericórdia do SENHOR.
Mas, o que estão ensinando?
Basicamente são apresentadas duas “alternativas” à compreensão ao texto.
A primeira seria a do “erro de escrita”. Seus proponentes defendem que a palavra para camelo foi mal escrita. Segundo eles as palavras gamla ("camelo") e gamala ("corda grossa") são parecidas e isso teria gerado a confusão. Então, segundo essa interpretação o texto se referia à impossibilidade de uma “corda grossa” passar pelo fundo de uma agulha. No final eles argumentam que isso não afetaria o que o texto “queria dizer”[1], sendo apenas um erro menor.
Mas, se isso for verdade, ainda é um erro (depois iremos refutar esse conceito).
A segunda diz que, na verdade, haveria uma portinhola na muralha de Jerusalém chamada “agulha”, “olho da agulha” ou ainda “fundo da agulha” e que seria muito pequena e estreita, o que dificultaria a passagem de um animal (ainda mais um camelo carregado de mercadorias ou pessoas). De acordo com esta tese seria a isso que o Senhor JESUS estaria se referindo.
Se analisamos com calma ambas linhas de pensamento elas parecem querer “resolver algo incômodo na Palavra”. Elas partem do mesmo pressuposto: a expressão está errada e não aceitam que o Senhor JESUS teria dito exatamente isso. Parece uma frase sem sentido para a “mente científica do homem moderno”. Será?
Por que Ele não teria dito exatamente isso? Por que deveríamos considerar como um erro?
E aí temos o início de nossa refutação. Se consideramos a hipótese de admitir esse “erro” quanto outros erros poderiam existir?
Se aceitamos a hipótese de um erro do autor original ou do copista negamos as Doutrinas da Plena Inspiração[2] e da Preservação da Escrituras
Será que os milagres não seriam um tipo de erro? Na verdade um famoso teólogo contemporâneo optou por definir algumas narrativas bíblicas como sendo “míticas” (vide a obre de Rudolf Bultmann) e isso foi uma das bases para que muitos teólogos passassem a crer que a Bíblia é um compêndio de mitos de uma época e de um povo e isso tem “enchido a cabeça” dos alunos em alguns dos principais seminários teológicos. Alunos estes que depois são ordenados ao pastorado e passam a exercer essa função em muitas igrejas pelo mundo.
Bom, essa ideia de "erro na grafia ou na cópia" entra em choque direto com a Doutrina da Preservação da Escrituras (que vimos acima) e acaba por negar que a Bíblia é a Palavra de DEUS e que o SENHOR é DEUS.
Não concordo com a tese de que houve um erro na composição de tal texto ou nas suas cópias. O Senhor JESUS usou na realidade uma hipérbole (figura de linguagem que usa o exagero para realçar determinada situação) e não há nenhum problema nisso.
Qual a minha base para tal afirmação além da Doutrina da Preservação da Escrituras?
Simples. Não há registro da existência de tal “porta” na cidade de Jerusalém em qualquer texto bíblico e nem nos textos judeus sobre a cidade. Seus proponentes se baseiam que tal porta teria sido identificada em algumas cidades sírias mais recentes, mas isso também não é uma certeza. Portando a “tese da porta” é infundada e deve ser desconsiderada.
Mas, e a questão de que poderia ser “corda” e não “camelo”. Essa tese parece ser mais bem embasada, contudo vamos ver o texto paralelo em Lucas?
Porque é mais fácil entrar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no reino de Deus. (Lucas 18.25)
Vejam que coisa interessante. O médico Lucas repete o texto sem alteração dos elementos (continua sendo ensinado sobre o camelo e a agulha). Ora, o médico era conhecedor de agulhas (afinal um médico sabia “costurar” as pessoas) e ele não corrige o texto, quando escreve em grego usa a mesma expressão (sim, é provável que o texto original de Mateus fosse em aramaico) e, mesmo em outro idioma os elementos se mantém. O que significa isso?
Que o ensino do Senhor JESUS era exatamente esse, versava sobre ser o fato de que ser salvo é de extrema dificuldade para aqueles que amam as coisas materiais (na verdade enquanto alguém ama qualquer outra coisa mais que ao SENHOR não poderá ser salvo).
Isso não é difícil de entender.
Espero neste textoter ajudado a cada um de vocês entenderem um pouco mais sobre como Preparar um Estudo Bíblico e como uma série de Doutrinas Cristãs estão envolvidas no preparo de um estudo bíblico.
Na verdade, ao prepararmos um estudo estamos ensinando e se ensinamos errado podemos incorrer em pecado e em condenação. Afinal de contas:
E tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, como ao Senhor, e não aos homens, sabendo que recebereis do Senhor o galardão da herança, porque a Cristo, o Senhor, servis. (Col 3.23 e 24)
Por isso tenhamos sempre a disposição de fazer o melhor que pudermos para o SENHOR, da melhor forma e com as melhores ferramentas, pois é isso que Ele requer de nós e isso alegra o coração e mente do que é verdadeiramente salvo.
Aquele, pois, que sabe fazer o bem e não o faz, comete pecado. (Tiago 4.17)
Um fraterno amplexo e que a sabedoria do SENHOR seja sobre e através de nós.
Victor Hugo Ramallo
Serve como pastor em
Igreja Batista Missão Vida (www.facebook.com/IBMVida)
Taboão da Serra - São Paulo - Brasil
[1} O argumento de que "o autor queria dizer" é muito usado entre os teólogos progressistas e pós-modernos, mas, como eles podem saber o que uma pessoa que morreu há séculos "queria" dizer? Só podemos ter o que ele (autor) escreveu e ser diligente na compreensão desse texto (friso que é compreensão)
[2] A Doutrina da Plena Inspiração ensina que os autores originais escreveram o texto exatamente conforme a vontade do SENHOR e guiados pelo Espírito Santo, dentro das características pessoais tanto literárias, como de conhecimento cultura e experiência.
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